domingo, 16 de maio de 2010

Atenção: o que muda com a prática e o que podemos fazer para facilitar a aprendizagem ?

De acordo com diversos autores (Adams, 1971; Fitts & Posner, 1967; Magill, 1989; Schmidt, 1988; 1991), existe uma relação positiva entre a facilidade para realizarmos qualquer atividade e a quantidade de prática. Dentre as diversas modificações que ocorrem a medida em que passamos de um estágio para outro, estão as reduções na carga dos processos de atenção e a habilidade de perceber e captar informações relevantes à tarefa. Com o tempo, as melhoras na “performance” decorrentes da prática ocorrerão naturalmente, porém existem situações em que não dispomos de todo o tempo necessário para aguardarmos que este processo ocorra normalmente. Em outras situações, caso tenhamos tempo para aguardar o curso natural e as conseqüências da prática, mesmo assim poderemos fazer uso de estratégias de atenção para facilitar a aprendizagem, fornecendo “dicas” sobre os aspectos relevantes, diminuindo as exigências nos processos de atenção dos alunos.
Em diversas situações, professores e técnicos são cobrados de resultados “imediatos” e neste caso, para tentarmos contornar estes problemas e sermos eficientes, necessitamos criar um ambiente que facilite a aprendizagem, principalmente, propiciando uma grande variedade de experiências. Para a criação deste ambiente propício à aprendizagem, temos que estar atentos que faz-se necessário diferenciar a informação que passamos quando estamos atuando com um adulto, da informação passada para uma criança. Thomas, Lee & Thomas (1988) classificam as crianças como “novatos universais”, devido a quantidade limitada de experiências que elas possuem. Esta falta de experiência pode refletir de diversas maneiras na execução de uma habilidade. No caso da atenção mais especificamente, será na dificuldade de atender aos fatores relevantes da atividade que está sendo executada, principalmente pelo fato de que os processos da atenção seletiva podem não estar totalmente desenvolvidos. Conforme exposto anteriormente, a atenção seletiva é extremamente importante na seleção e armazenamento de informações relevantes, associadas ao que estaremos retendo na memória de longa duração, ou seja, o processamento de informações.
O processamento de informações relaciona-se com a habilidade de selecionar, processar, reter, armazenar e disponibilizar informações, conforme a necessidade. Quando comparadas aos adultos, as crianças tem duas grandes dificuldades: 1) elas processam informações mais lentamente (Chi, 1976, 1977, 1978; Gallagher & Thomas, 1980; Thomas, 1980); 2) são ineficientes na utilização dos processos de controle da Memória (Thomas, Lee & Thomas, 1988). Os processos de controle, ou estratégias cognitivas que o indivíduo pode utilizar na memória de curta e de longa duração para armazenar e recuperar informações, são cinco: rótulo; repetição; decisão; procura e busca (recuperação); condensar e juntar.
Estas dificuldades no processamento de informações refletirão diretamente na “performance”, pois se a criança não consegue absorver toda a informação ou ainda, mesmo que possa, não consegue rete-la (armazenar) na memória de longa duração, não conseguirá realizar a tarefa consistentemente após alguns dias. Dependendo do tipo de habilidade que está sendo aprendida e o estágio de aprendizagem que o indivíduo encontra-se, a carga nos processos da atenção pode aumentar ou diminuir. Quando nos colocamos frente aos alunos para ensinar-lhes algo, necessitamos primeiramente avaliar o seu conhecimento prévio e observar o estágio em que se encontram, para então planejarmos as atividades. A fim de facilitar a aprendizagem, este planejamento deve seguir uma seqüência que vai da parte mais fácil para a mais difícil.
Outro fator a ser respeitado, é a utilização de estratégias para direcionar a atenção dos alunos às partes mais importantes da atividade que estão realizando. De acordo com o que foi colocado anteriormente, o processo de direcionar o foco da atenção para um determinado ponto é definido como atenção seletiva (Ladewig, Gallagher & Campos, 1994). Dependendo do estágio de aprendizagem que o aluno se encontra, o processo de seleção e descarte de informações não é eficiente, o que dificultará a “performance”. O uso correto de estratégias de atenção seletiva facilitará a seleção de informações relevantes, como também auxiliará no descarte de informações irrelevantes à atividade que está sendo realizada.
Diversos estudos demonstraram a eficiência da utilização de estratégias de atenção seletiva na aprendizagem da parada de mão e rolamento para frente (Masser, 1993), auxiliando a lembrar locais de movimento (Winther & Thomas, 1981) e na seleção de informações dinâmicas no meio ambiente (Ladewig, 1994; Ladewig, Cuthma & Martins, 1998; Ladewig & Gallagher, 1994; Ladewig, Gallagher, & Campos, 1994, 1995). Masser (1993) por exemplo, encontrou resultados significativamente melhores logo após a prática e com três meses de retenção, em favor do grupo que se utilizou das dicas durante a aprendizagem da parada de mão.

Considerações finais

O tipo da estratégia e quais os pontos relevantes, a qual o indivíduo direcionará a sua atenção, deverão ser selecionadas pelo professor, baseados nas suas experiências sobre a atividade. Caso as dicas selecionadas não estejam trazendo o resultado esperado, o professor deverá reavaliá-las e determinar quais as novas palavras (ou frases) que poderão auxiliar o aprendizado da habilidade em questão.
Estamos conscientes de que, com o tempo, a prática fará com que o indivíduo chegue a automaticidade, reduzindo significativamente os requerimentos nos processos da atenção. Muitos estudos, entre eles alguns descritos na obras de Simon (ver Models of Thought, v.1 e v.2), descrevem as vantagens dos métodos de “auto aprendizagem” “aprendendo fazendo” ou o da “tentativa e erro” e o poder de retenção que eles possuem, quando comparados aos vários métodos de instrução com professor. Com certeza, o indivíduo que começa a mexer no computador e vai aos poucos descobrindo o que pode e o que não pode fazer, após muita prática e mesmo que cometendo erros graves, irá aprender muito sobre diversos programas. Porém, durante este período de “auto aprendizagem” ocorrem muitos momentos de fracassos e frustrações e que dependendo da pessoa, poderá causar a desistência e/ou o desinteresse pela aprendizagem da tarefa. Isto pode acontecer também, no ambiente escolar, nas aulas de educação física com as crianças que são deixadas de lado pelos professores.
O ponto que estamos querendo chegar é que existem vantagens e desvantagens nos métodos de auto aprendizagem descritos anteriormente, como também existem vantagens e desvantagens nos métodos tradicionais de ensino. Não podemos deixar os nossos alunos praticando sozinhos o tempo todo, proporcionando-lhes mais experiências de fracasso do que de sucesso, como também não devemos passar todos os detalhes, de uma maneira gessada, sem que eles assimilem o porque e como estão fazendo. O objetivo principal durante a aprendizagem de qualquer atividade é fazer com que o aluno obtenha sucesso e sinta prazer no que esta fazendo.
Creio que devemos encontrar um meio termo, com o professor passando algumas informações sobre os objetivos da tarefa e os prontos críticos que necessitarão de atenção e aí deixá-los praticar. Em determinadas situações, questioná-los sobre o que está acontecendo de errado e quais algumas das soluções que eles teriam para contornar o problema. Em outras situações, fazer uso de estratégias cognitivas (dicas de aprendizagem), principalmente voltadas à melhora da atenção seletiva aos pontos críticos.
Após uma boa quantidade de prática, as crianças podem aprender a executar o toque correto no voleibol, porém o professor poderá facilitar a aprendizagem e quem sabe, diminuir o tempo necessário para chegar ao movimento ideal, utilizando-se das dicas “mãos em forma de triângulo acima da cabeça” e “tocar na bola olhando através do triângulo”. Na natação, ensinando a recuperação e rotação do braço no nado costas para crianças de cinco a sete anos, a dica “dedão, dedão, dedão, dedinho, dedinho, dedinho” pode trazer resultados satisfatórios. O nome da terminologia utilizada, dica, estratégia ou rótulo, não é relevante, o importante é fazer uso, sempre que possível, de estratégias cognitivas que facilitem a aprendizagem, principalmente nos estágios iniciais, com o objetivo de reduzir as demandas nos processos de atenção do seu aluno. “Quando o aprendizado ocorre através da utilização de métodos com significados relevantes, fortes traços na memória são criados, melhorando a retenção” (Tese de Koffka, citado por Katona, 1940).

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