domingo, 6 de junho de 2010

Envelhecimento e stress: Aspectos gerais e teorias atuais

A senescência é o processo natural do envelhecimento, o qual compromete progressivamente aspectos físicos e cognitivos. Segundo a OMS, a terceira idade tem início entre os 60 e 65 anos. Entretanto, esta é uma idade instituída para efeito de pesquisa, já que o processo de envelhecimento depende de três classes de fatores principais: biológicos, psíquicos e sociais. São estes fatores que podem preconizar a velhice, acelerando ou retardando o aparecimento e a instalação de doenças e de sintomas característicos da idade madura. Porém, nesta revisão estamos considerando a faixa etária em torno dos 50 anos a fim de relacionar as mudanças neuroendócrinas que ocorrem nesta fase ao processo de envelhecimento e o progressivo acometimento psicossocial relacionado. Neste trabalho a influência do estresse na vida dos idosos vai ser o tema principal de nossa discussão, uma vez que esta parcela da população está sujeita a uma carga diferenciada de estressores. Durante o envelhecimento, além dos fatores psicossociais como vilões temos o estresse do cotidiano, podendo causar grandes transtornos na vida do indivíduo. O envelhecimento é causado por alterações moleculares e celulares, que resultam em perdas funcionais progressivas dos órgãos e do organismo como um todo. Esse declínio se torna perceptível ao final da fase reprodutiva, muito embora as perdas funcionais do organismo comecem a ocorrer muito antes. O sistema respiratório e o tecido muscular, por exemplo, começam a decair funcionalmente já a partir dos 30 anos (Hoffman, 2003). Na verdade, logo depois de se atingir a maturidade reprodutiva as chances de sobrevivência do indivíduo já começam a diminuir. Essa tendência faz parte do processo de evolução de todos os organismos pluricelulares. Assim, o desenvolvimento, a reprodução e o envelhecimento são etapas naturais da vida de cada espécie, que ocorrem de forma seqüencial e interdependente: o início da senescência é dependente da fase reprodutiva que, por sua vez, é dependente do desenvolvimento. No entanto, não há uma separação rígida entre as três fases. As mudanças funcionais que ocorrem com o avanço da idade são atribuídas a vários fatores, como defeitos genéticos, fatores ambientais, surgimento de doenças e expressão de genes do envelhecimento, ou gerontogenes (Hoffman, 2003). No entanto, embora seja uma fase previsível da vida, o processo de envelhecimento não é geneticamente programado. Não existem genes que determinam como e quando envelhecer. Há sim, genes variantes cuja expressão favorecem a longevidade ou reduzem a duração da vida. Várias teorias foram propostas para explicar o processo do envelhecimento. A mais abrangente, e mais amplamente aceita cientificamente na atualidade, é a teoria do envelhecimento pelos radicais livres. Segundo a teoria de Harman, o envelhecimento e as doenças degenerativas a ele associadas, resultam de alterações moleculares e lesões celulares desencadeadas por radicais livres (Hoffman, 2003, Harman, 2001, Harman 1992). Esta teoria foi proposta em 1954 pelo médico Denham Harman, pesquisador da Universidade de Nebraska nos EUA, mas só adquiriu aceitação na comunidade científica depois dos anos 70, quando se descobriu a toxicidade do oxigênio. Segundo a teoria de Harman, o envelhecimento e as doenças degenerativas a ele associadas, resultam de alterações moleculares e lesões celulares desencadeadas pelos radicais livres (Harman, 2001, 1992). Essa teoria é ancorada nas inúmeras evidências científicas de que estes radicais livres estão envolvidos praticamente em todas as doenças típicas da idade, como a arteriosclerose, as doenças coronárias, a catarata, o câncer, a hipertensão, as doenças neurodegenerativas e outras (Harman, 2001 para revisão).


Referências bibliográficas

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Hoffmann, M. E. (2003). Bases Biológicas do Envelhecimento. Revista Idade Ativa, Campinas, SP

domingo, 16 de maio de 2010

Primeira Infância e seu universo surreal

A criança é feita de cem. A criança tem cem mãos, cem pensamentos, cem modos de pensar de jogar e de falar. Tem cem modos de escutar as maravilhas de amar.

A criança tem cem alegrias de compreender, cem mundos para descobrir, cem mundos para inventar e cem mundos para sonhar, mas roubaram-lhe noventa e nove. A escola e a cultura, separando a cabeça do corpo.
Dizem-lhe que o jogo e o trabalho, a realidade e a fantasia, a ciência e a imaginação, o céu e a terra, a razão e o sonho, são coisas que estão juntas.
Dizem-lhe que as cem não existem, e a criança diz:
- Ao contrario, as cem existem. (Loris Malaguzzi).

É nesse mundo de fantasias e, que toda criança vive que iremos vivenciar experiências na primeira infância tanto culturalmente como biologicamente. E para entendermos melhor esse mundo de fantasias das crianças, nada melhor que o surrealismo para tentar nos mostrar esse mundo irreal.
O período da primeira infância é de 2 a 6 anos, embora alguns pesquisadores considere o inicio da primeira infância com 18 meses por ser essa a idade média em que as crianças começam a andar independentemente, e as variações entre as crianças são grandes e em nenhum momento há uma interrupção sensível nas características do crescimento humano (Helen Eckert, 1993).
A idade de 2 anos como inicio, é considerado a divisão aceitável entre lactância e o período inicial da infância que é a mais freqüente usada por se prestar a comparações de idade em forma mais rápida de entendimento. (Helen Eckert, 1993) ainda afirma que embora os ganhos em altura e peso continuem em taxas ligeiramente uniformes durante o período da primeira infância, a taxa de ganho em altura é quase o dobro do que em peso. Os membros inferiores crescem rapidamente em proporção ao comprimento do tronco, mas nem os ombros nem a cintura pélvica aumentam rapidamente.
Durante esse período também não há diferença entre sexo com respeito à relação da largura da região pélvica. Com o inicio da condição de andar, o mundo de criança rapidamente aumenta, de forma literal, podendo ir a qualquer lugar. Uma vez que ela possui um cresente aumento em idade, e muito dessa energia é centrada em atividades motoras grossas.
A professora  Carla Soleto fez um estudo coletivo de autores como Piaget, Vygotsky, Wallon, Miguel Zabalza, Paulo Freire, Edgar Morin e Maturana e chegou a algumas caracterizações sobre a primeira infância. Elas tem como características:

- Melhor coordenação dos músculos menores (coordenação motora fina);

- Mostra uma grande habilidade para pintar, desenhar, e modelar;

- Está sempre pronta a adquirir novas experiências, tem muita criatividade: cava, sobe, desce, luta e constrói constantemente;

- Apresenta grande energia, quase não sente cansaço;

- Apresenta bom relatos de experiências e gosta de contar histórias;

- Tem concentração mais longa em atividades livres;

- Pode desenhar relacionando diversos objetos em cena única.

Maturação e Aprendizagem

Durante toda a sua vida, o ser humano tem que ajudar-se as mudanças causadas pelas transformações do seu próprio corpo e pelos fatores do meio em que vive. Em um certo estágio do desenvolvimento se torna possível para as crianças tentar andar. Nossa expressão comum “tentar andar”, reconhece a necessidade de pratica para aperfeiçoar esta função (Helen Eckert, 1993).
Pesquisadores no campo do desenvolvimento humano são freqüentemente confrontados com o problema de distinguir entre mudanças e comportamentos resultantes dos processos de maturação e aprendizagem da parte da criança.

Segundo Helen, características essenciais da maturação são comumentes registradas como:

- O aparecimento súbto de novos padrões de crescimento ou comportamento;

- O aparecimento de habilidades especiais sem o beneficio de praticas anteriores;

- A consistência destes padrões em diferentes sujeitos da mesma espécie;

- A seqüência ordenada das manifestações das diferenças padrões;

- O curso gradual de crescimento físico e biológico em direção a obtenção de status de completamente desenvolvido.

O desenvolvimento abrange processos fisiológicos, psicológicos e ambientais. Tanto o crescimento como o desenvolvimento produzem mudanças nos componentes fisicos, mental, emocional e social da criança, independentemente de sua vontade.
É oportuno lembrar que se a criança não está apta a executar uma determinada atividade, não poderá aprende-la, pois disporá de condições para a sua realização. Toda aprendizagem depende da maturação (condições orgânicas e psicológicas) e das condições ambientais (cultura, classe social, etc) (Vygotsky).
Com essa mesma linha de raciocínio, Vygotsky afirma que é através da aprendizagem que a criança desenvolve os comportamentos que possibilita viver melhor. E atualmente outros estudiosos afirmam que esse processo se inicia antes do nascimento.

“O desenvolvimento de conceito de tempo pode ser estudado significamente somente em contextos que envolvam movimento físico no espaço por que uma criança jovem compreende um intervalo de tempos em termos da velocidade de movimento ou a quantidade de rendimento, tal como o espaço (ou distância) atravessado ou de material movido” ( Piaget, 1969).

Atenção: o que muda com a prática e o que podemos fazer para facilitar a aprendizagem ?

De acordo com diversos autores (Adams, 1971; Fitts & Posner, 1967; Magill, 1989; Schmidt, 1988; 1991), existe uma relação positiva entre a facilidade para realizarmos qualquer atividade e a quantidade de prática. Dentre as diversas modificações que ocorrem a medida em que passamos de um estágio para outro, estão as reduções na carga dos processos de atenção e a habilidade de perceber e captar informações relevantes à tarefa. Com o tempo, as melhoras na “performance” decorrentes da prática ocorrerão naturalmente, porém existem situações em que não dispomos de todo o tempo necessário para aguardarmos que este processo ocorra normalmente. Em outras situações, caso tenhamos tempo para aguardar o curso natural e as conseqüências da prática, mesmo assim poderemos fazer uso de estratégias de atenção para facilitar a aprendizagem, fornecendo “dicas” sobre os aspectos relevantes, diminuindo as exigências nos processos de atenção dos alunos.
Em diversas situações, professores e técnicos são cobrados de resultados “imediatos” e neste caso, para tentarmos contornar estes problemas e sermos eficientes, necessitamos criar um ambiente que facilite a aprendizagem, principalmente, propiciando uma grande variedade de experiências. Para a criação deste ambiente propício à aprendizagem, temos que estar atentos que faz-se necessário diferenciar a informação que passamos quando estamos atuando com um adulto, da informação passada para uma criança. Thomas, Lee & Thomas (1988) classificam as crianças como “novatos universais”, devido a quantidade limitada de experiências que elas possuem. Esta falta de experiência pode refletir de diversas maneiras na execução de uma habilidade. No caso da atenção mais especificamente, será na dificuldade de atender aos fatores relevantes da atividade que está sendo executada, principalmente pelo fato de que os processos da atenção seletiva podem não estar totalmente desenvolvidos. Conforme exposto anteriormente, a atenção seletiva é extremamente importante na seleção e armazenamento de informações relevantes, associadas ao que estaremos retendo na memória de longa duração, ou seja, o processamento de informações.
O processamento de informações relaciona-se com a habilidade de selecionar, processar, reter, armazenar e disponibilizar informações, conforme a necessidade. Quando comparadas aos adultos, as crianças tem duas grandes dificuldades: 1) elas processam informações mais lentamente (Chi, 1976, 1977, 1978; Gallagher & Thomas, 1980; Thomas, 1980); 2) são ineficientes na utilização dos processos de controle da Memória (Thomas, Lee & Thomas, 1988). Os processos de controle, ou estratégias cognitivas que o indivíduo pode utilizar na memória de curta e de longa duração para armazenar e recuperar informações, são cinco: rótulo; repetição; decisão; procura e busca (recuperação); condensar e juntar.
Estas dificuldades no processamento de informações refletirão diretamente na “performance”, pois se a criança não consegue absorver toda a informação ou ainda, mesmo que possa, não consegue rete-la (armazenar) na memória de longa duração, não conseguirá realizar a tarefa consistentemente após alguns dias. Dependendo do tipo de habilidade que está sendo aprendida e o estágio de aprendizagem que o indivíduo encontra-se, a carga nos processos da atenção pode aumentar ou diminuir. Quando nos colocamos frente aos alunos para ensinar-lhes algo, necessitamos primeiramente avaliar o seu conhecimento prévio e observar o estágio em que se encontram, para então planejarmos as atividades. A fim de facilitar a aprendizagem, este planejamento deve seguir uma seqüência que vai da parte mais fácil para a mais difícil.
Outro fator a ser respeitado, é a utilização de estratégias para direcionar a atenção dos alunos às partes mais importantes da atividade que estão realizando. De acordo com o que foi colocado anteriormente, o processo de direcionar o foco da atenção para um determinado ponto é definido como atenção seletiva (Ladewig, Gallagher & Campos, 1994). Dependendo do estágio de aprendizagem que o aluno se encontra, o processo de seleção e descarte de informações não é eficiente, o que dificultará a “performance”. O uso correto de estratégias de atenção seletiva facilitará a seleção de informações relevantes, como também auxiliará no descarte de informações irrelevantes à atividade que está sendo realizada.
Diversos estudos demonstraram a eficiência da utilização de estratégias de atenção seletiva na aprendizagem da parada de mão e rolamento para frente (Masser, 1993), auxiliando a lembrar locais de movimento (Winther & Thomas, 1981) e na seleção de informações dinâmicas no meio ambiente (Ladewig, 1994; Ladewig, Cuthma & Martins, 1998; Ladewig & Gallagher, 1994; Ladewig, Gallagher, & Campos, 1994, 1995). Masser (1993) por exemplo, encontrou resultados significativamente melhores logo após a prática e com três meses de retenção, em favor do grupo que se utilizou das dicas durante a aprendizagem da parada de mão.

Considerações finais

O tipo da estratégia e quais os pontos relevantes, a qual o indivíduo direcionará a sua atenção, deverão ser selecionadas pelo professor, baseados nas suas experiências sobre a atividade. Caso as dicas selecionadas não estejam trazendo o resultado esperado, o professor deverá reavaliá-las e determinar quais as novas palavras (ou frases) que poderão auxiliar o aprendizado da habilidade em questão.
Estamos conscientes de que, com o tempo, a prática fará com que o indivíduo chegue a automaticidade, reduzindo significativamente os requerimentos nos processos da atenção. Muitos estudos, entre eles alguns descritos na obras de Simon (ver Models of Thought, v.1 e v.2), descrevem as vantagens dos métodos de “auto aprendizagem” “aprendendo fazendo” ou o da “tentativa e erro” e o poder de retenção que eles possuem, quando comparados aos vários métodos de instrução com professor. Com certeza, o indivíduo que começa a mexer no computador e vai aos poucos descobrindo o que pode e o que não pode fazer, após muita prática e mesmo que cometendo erros graves, irá aprender muito sobre diversos programas. Porém, durante este período de “auto aprendizagem” ocorrem muitos momentos de fracassos e frustrações e que dependendo da pessoa, poderá causar a desistência e/ou o desinteresse pela aprendizagem da tarefa. Isto pode acontecer também, no ambiente escolar, nas aulas de educação física com as crianças que são deixadas de lado pelos professores.
O ponto que estamos querendo chegar é que existem vantagens e desvantagens nos métodos de auto aprendizagem descritos anteriormente, como também existem vantagens e desvantagens nos métodos tradicionais de ensino. Não podemos deixar os nossos alunos praticando sozinhos o tempo todo, proporcionando-lhes mais experiências de fracasso do que de sucesso, como também não devemos passar todos os detalhes, de uma maneira gessada, sem que eles assimilem o porque e como estão fazendo. O objetivo principal durante a aprendizagem de qualquer atividade é fazer com que o aluno obtenha sucesso e sinta prazer no que esta fazendo.
Creio que devemos encontrar um meio termo, com o professor passando algumas informações sobre os objetivos da tarefa e os prontos críticos que necessitarão de atenção e aí deixá-los praticar. Em determinadas situações, questioná-los sobre o que está acontecendo de errado e quais algumas das soluções que eles teriam para contornar o problema. Em outras situações, fazer uso de estratégias cognitivas (dicas de aprendizagem), principalmente voltadas à melhora da atenção seletiva aos pontos críticos.
Após uma boa quantidade de prática, as crianças podem aprender a executar o toque correto no voleibol, porém o professor poderá facilitar a aprendizagem e quem sabe, diminuir o tempo necessário para chegar ao movimento ideal, utilizando-se das dicas “mãos em forma de triângulo acima da cabeça” e “tocar na bola olhando através do triângulo”. Na natação, ensinando a recuperação e rotação do braço no nado costas para crianças de cinco a sete anos, a dica “dedão, dedão, dedão, dedinho, dedinho, dedinho” pode trazer resultados satisfatórios. O nome da terminologia utilizada, dica, estratégia ou rótulo, não é relevante, o importante é fazer uso, sempre que possível, de estratégias cognitivas que facilitem a aprendizagem, principalmente nos estágios iniciais, com o objetivo de reduzir as demandas nos processos de atenção do seu aluno. “Quando o aprendizado ocorre através da utilização de métodos com significados relevantes, fortes traços na memória são criados, melhorando a retenção” (Tese de Koffka, citado por Katona, 1940).

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A importância da atenção para a aprendizagem

O estudo da atenção tem despertado a curiosidade de inúmeros pesquisadores há mais de um século. A atenção de uma maneira abrangente pode ser definida como o processo que direciona, seleciona, alerta, delibera, contempla (The Random House Thesaurus, 1987). Segundo Abernethy (1993), atenção é um termo global utilizado para definir vários processos que variam da concentração à vigilância.
A busca de melhores explicações para o fenômeno da atenção direcionou pesquisadores à concentrarem seus esforços em favor da criação de teorias, as quais consideravam a atenção como um mecanismo tipo filtro. A hipótese geral era que o mecanismo da atenção possuía uma capacidade fixa para processar informações e cada vez que esta capacidade fosse ultrapassada pelos requerimentos da tarefa, o “desempenho” decairia (Kahneman, 1963). Assim, no início a atenção era vista como um canal único (filtro) (Broadbent, 1958; Wellford, 1952), surgindo a seguir a hipótese dos canais múltiplos (Deutsch & Deutsch, 1963; Treisman, 1960, 1964, 1969; Keele, 1973). Mais recentemente, a atenção passou a ser vista como um processo automático versus controlado (Posner & Snyder, 1975; Schneider, Dumais & Shiffrin, 1984; Schneider & Fisk, 1982; Schneider & Shiffrin, 1977; Shiffrin & Dumais, 1981; Shiffrin & Schneider, 1977).
A hipótese de um único filtro ou canal indicava que todos os processos requeriam atenção e somente uma operação de estímulo - resposta poderia ser executada de cada vez (Welford, 1952), ou o que Broadbent (1958) definiu como o processamento serial de informações. Esta idéia foi contestada mais tarde por diversos pesquisadores, entre eles Deutsch & Deutsch (1963), Treisman (1960, 1964, 1969) e Keele (1973), os quais demonstraram que os indivíduos eram capazes de lidar com mais de um estímulo de cada vez. A teoria da “atenuação” de Treisman por exemplo, utilizou-se de experimentos em que mensagens gravadas de características coerentes e incoerentes eram transmitidas através de um fone de ouvido, passando do ouvido esquerdo para o direito e vice versa. A autora concluiu que os indivíduos foram capazes de “seguir” as mensagens coerentes, independentemente da mudança de ouvido, sugerindo que as mensagens incoerentes eram atenuadas, mas não desapareciam. A mensagem era enfraquecida (atenuada) quando não tinha
relevância à tarefa, sendo que os indivíduos utilizavam-se do conteúdo das mensagens para selecioná-las e decidirem entre os tópicos relevantes e irrelevantes.
A grande diferença entre estas teorias é a localização do filtro, ou seja, enquanto Broadbent (1958) e Welford (1952) colocaram o filtro no início do processo de seleção, Treisman (1960, 1964, 1969), Deutsch & Deutsch (1963) e Keele (1973), propuseram que o filtro se encontrava mais além dentro desse processo que seleciona as informações. Porém, todos estes autores concordam que o estímulo antes do filtro é livre de atenção, sendo processado em paralelo (simultaneamente) e quando atinge o filtro, passa a ser processado de maneira serial (individualmente), exigindo atenção. Entretanto, nenhuma destas teorias obtiveram sucesso em apontar com precisão o local do filtro. Abernethy (1993) por outro lado, menciona que a posição do filtro varia de acordo com o tipo de atividade realizada, podendo existir vários filtros, dependendo das combinações da tarefa e as estratégias utilizadas pelos indivíduos. Apesar de não haver concordância entre os autores previamente mencionados quanto a localização do filtro, eles concordam que a atenção possui duas características marcantes: 1) capacidade limitada; 2) processa a informação de maneira seriada.
Abernethy (1993), Anderson (1990), Broadbent (1958), Cherry (1953), Kahneman (1973), Magill (1989), Schmidt (1988), Treisman (1960, 1964, 1969), Schneider & Shiffrin (1977), Shiffrin (1989), Shiffrin & Schneider (1977), Shiffrin & Dumais (1981), Schneider, Dumais & Shiffrin (1984) definem capacidade limitada como sendo a dificuldade do indivíduo em atender diversos estímulos ao mesmo tempo. Kahneman (1973) vai além, concluindo que atividades diferentes impõem diferentes demandas nesta capacidade limitada da atenção e que quando ocorre um desequilíbrio entre a capacidade da atenção e a demanda, a “performance” deteriorar se- á consideravelmente. Este fato foi comprovado nos experimentos de tarefas simultâneas (“dual task”), onde os sujeitos tiveram dificuldades em realizar as duas atividades com a mesma precisão, sem que ocorresse uma queda de rendimento em uma das tarefas. Os resultados demonstraram uma troca, quando a tarefa “A” recebia mais atenção, a “performance” da tarefa “B” deteriorava e vice versa.
Entretanto, se caso uma destas tarefas estiverem automatizadas pelo sujeito, a quantidade de atenção necessária será menor, facilitando a realização de tarefas simultâneas. Para exemplificar esta situação, retornamos ao exemplo da criança que está aprendendo a driblar uma bola de basquete, citado anteriormente. Após uma quantidade considerável de prática, ela consegue, ao mesmo tempo, driblar a bola e observar a posição dos companheiros e dos adversários em uma partida. A distribuição da atenção, durante a realização de atividades paralelas, pode variar em função da complexidade da tarefa (Shiffrin, 1989), as instruções fornecidas ao indivíduo e o seu nível de habilidade (Ivry, 1996). Anderson (1990), investigando habilidades altamente sofisticadas, concluiu que as demandas no processo de atenção diminuem quando o indivíduo atinge uma fase autônoma. O autor, aliado aos resultados previamente obtidos por Shiffrin (1989) concluiu que existe uma relação negativa entre a prática e os requerimentos da atenção, suportando também a idéia da transição entre os estágios da aprendizagem.

Atenção seletiva

A atenção seletiva pode ser definida como a habilidade do indivíduo dirigir o foco da atenção à um ponto em particular no meio ambiente (Ladewig, Gallagher & Campos, 1994). Gallagher, French, Thomas & Thomas (1993) ressaltam que a atenção seletiva atua no processo de codificação das dicas específicas relacionadas a tarefa e também, como controladora do processo que mantém informações relevantes na memória de curta duração. Segundo Treisman (1992) e Craik (1996), a atenção seletiva é um pré-requisito para a codificação de informações e os processos de codificação e recuperação são dirigidos pela percepção e a atenção. Ou seja, a atenção seletiva determina o que é percebido e codificado na memória (e com que grau de elaboração), que por sua vez poderá facilitar a recuperação da informação. Adler, Gerhardstein & Rovee-Collier (1998, p.280) citando Irwin (1991, 1992), Lewis, (1970), Moray, (1959) e Treisman, Squire & Green (1974) mencionam que “informações atendidas, em geral são muito bem lembradas, ao contrário de informações que não receberam atenção, que em geral não são lembradas e quando são, são muito vagas”.
O problema de falta de atenção na aprendizagem pode atingir indivíduos de todas as idades, porém é nas crianças, principalmente na faixa etária dos cinco aos oito anos de idade, que podemos considerar como um período crítico. É nesta faixa etária que elas são tidas ou mais conhecidas “por não prestarem a atenção”. Entretanto, é a partir desta idade que se inicia o desenvolvimento da habilidade de atender e selecionar informações contidas no meio ambiente. De acordo com Ross (1976) as estratégias de atenção seletiva não são usadas espontaneamente até o início da adolescência, em torno dos 11 anos de idade. Este processo desenvolve-se em estágios, onde durante o primeiro estágio (exclusivo) bebês e crianças muito jovens são atraídas por um único estímulo. Por exemplo, o bebê que fica brincando com o chocalho vários minutos, ignorando os outros brinquedos que estão ao seu redor.
Quando a criança atinge a primeira série do ensino fundamental, seus processos de atenção passaram por diversas mudanças e podem agora ser classificados como atingindo o segundo estágio, chamado de inclusivo. Neste estágio ela é facilmente distraída pelas inúmeras informações contidas no meio ambiente, atendendo à várias coisas ao mesmo tempo, não sendo capaz de separar as informações relevantes das irrelevantes. Pode-se citar como exemplo a criança que entra pela primeira vez em uma aula de natação e ao sair do vestiário para a piscina infantil, fica atraída pelo ambiente que contém além da própria piscina, outras crianças, diversos brinquedos e professores. Há uma grande chance de que esta criança tenha dificuldade em prestar atenção nas instruções do professor, devido a grande quantidade de informações contidas no meio ambiente da atividade.
Finalmente na adolescência, os jovens são capazes de selecionar as informações relevantes, ao mesmo tempo que descartam o que é irrelevante em uma gama de informações do meio ambiente. Este estágio é chamado por Ross (1976) de atenção seletiva. Um exemplo para ilustrar este estágio é o de uma criança que aprendeu a andar recentemente e é colocada em uma sala repleta de pessoas. Quando ela caminha em direção aos seus pais, estará olhando para eles ao invés do caminho que deverá seguir, consequentemente poderá colidir com uma outra pessoa e cair. Por outro lado, um adulto não terá dificuldade em caminhar no mesmo ambiente.
É claro que para toda a regra existe uma exceção! Neste caso, alguém poderá perguntar quais são os fatores que diferenciam as crianças jovens que conseguem prestar a atenção daquelas que não conseguem? Cada criança tem características próprias, que as tornam diferentes uma das outras. Estas diferenças podem ser decorrentes da própria educação recebida em casa (uma criação mais liberal versus uma criação mais restrita), fatores genéticos (déficit de atenção), etc. De uma maneira geral, as crianças mais jovens encontram dificuldades em prestar a atenção no professor ou até mesmo em brincadeiras com os amigos.
Hoje, da atividade mais simples à mais complexa, as crianças estão expostas constantemente a uma variedade de experiências onde é extremamente importante selecionar corretamente informações (dicas) relevantes à tarefa. A partir do momento que as crianças não desenvolvem completamente as estratégias da atenção seletiva até alcançarem à adolescência, a sua “performance” pode ser afetada caso não consiga selecionar corretamente as diversas informações de caráter proprioceptivas e exterioceptivas disponíveis no meio ambiente da atividade que estão realizando. O uso de estratégias cognitivas com a finalidade de auxiliar as crianças a lidarem com as distrações do meio ambiente, focando nos aspectos relevantes da tarefa, demonstrou efeitos positivos em diversas situações: 1) na seleção de informações dinâmicas no meio ambiente (Ladewig, 1994; Ladewig, Cuthma & Martins, 1998; Ladewig & Gallagher, 1994; Ladewig, Gallagher, & Campos, 1994, 1995); 2) na “performance” da parada de mão e do rolamento para a frente (Masser, 1993); 3) na “performance” de atividades que necessitam lembrar do local do movimento (Winther & Thomas, 1981).
Dentro desta perspectiva, devemos estar conscientes de que quando trabalharmos com crianças e adolescentes, necessitamos criar estratégias com o objetivo de direcionarmos o foco de atenção das crianças para os pontos críticos da atividade que estamos ensinando e consequentemente, facilitar a “performance”.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Desenvolvimento moral, social e julgamento moral

A culpa, um importante aspecto afetivo do desenvolvimento moral, tem sido utilizada como um de seus principais indicadores. Nas crianças, a culpa aprimora-se gradualmente, sendo influenciada pelos modelos de moralidade e métodos disciplinares aos quais estão expostas (Harris, 1989). Na busca do entendimento de como se dá a evolução do desenvolvimento moral, tão decisivo à interação de um indivíduo com os demais membros do seu grupo social, um grande número de pesquisas tem sido realizado, dando suporte ao surgimento de diversas teorias sobre o assunto. Segundo Bee (1984), o desenvolvimento moral é um tema que pode ser subdividido em três subtemas referentes a aspectos particulares do desenvolvimento da consciência. O primeiro é o comportamento moral e diz respeito ao direcionamento do próprio comportamento, por exemplo pela criança a partir do acatamento de regras internalizadas. O segundo trata dos sentimentos morais, ou seja, da parte afetiva da moralidade. Refere-se aos sentimentos negativos envolvidos na transgressão e dela decorrentes, como a vergonha e a culpa, e diz respeito também aos sentimentos positivos envolvidos em situações que estão de acordo com os padrões morais ou normativos vigentes ou que os sobrepujam, como a satisfação, o auto-respeito e o orgulho. O último é o julgamento moral e envolve o elemento cognitivo do desenvolvimento da moralidade. Trata de aspectos como a capacidade da criança determinar se alguma ação é certa ou errada, se alguém é culpado ou não. Envolve a investigação do desenvolvimento desta habilidade e das mudanças dos padrões aplicados pelas crianças às ações com o avanço da idade. Freqüentemente, os estudos sobre o desenvolvimento moral têm tratado estes três elementos da moralidade separadamente, porém, defende-se que o julgamento, os sentimentos e os comportamentos morais estão intrinsecamente relacionados entre si.


Piaget foi um dos primeiros estudiosos do pensamento moral e, inicialmente, dedicou-se à análise do desenvolvimento das regras em jogos infantis, buscando compreender um pouco o comportamento das crianças diante de um sistema de regras. Segundo ele, "toda moral consiste num sistema de regras e a essência de toda moralidade deve ser procurada no respeito que o indivíduo adquire por essas regras" (Piaget, 1977, p.11). Posteriormente, dedicou-se à análise do julgamento moral, estudando os efeitos da coação adulta em problemas relativos às mentiras, roubos e desajeitamentos praticados pelas crianças. Neste âmbito, observou como elas se posicionam diante de situações envolvendo acidentes ou danos intencionais, no papel de avaliadoras do ato do personagem e do prejuízo causado. Utilizou-se de entrevistas, nas quais apresentavam-se às crianças pares de histórias (dilemas), onde os personagens deveriam ser comparados e julgados no sentido de saber se ambos os personagens eram igualmente culpados ou se um era mais culpado do que o outro e porque. A partir disso, Piaget propôs a existência de dois estágios evolutivos no desenvolvimento do raciocínio moral da criança, a saber:

Heteronomia - Caracteriza-se pelo predomínio do respeito unilateral, do realismo moral e da responsabilidade objetiva. Nesta fase, a criança possui uma concepção de regra como algo exterior à consciência e imposto pelo adulto. O bem é definido pela obediência rigorosa às regras. O julgamento das ações é realizado em função da responsabilidade sobre a gravidade ou o prejuízo causado.

Autonomia - A moral autônoma possui como elemento essencial a cooperação, possibilitadora do surgimento do respeito mútuo e da responsabilidade subjetiva. As crianças começam a intensificar os julgamentos de acordo com as intenções e não somente pelas conseqüências. Envolve a noção de justiça, a mais racional das noções morais.

A posição de Piaget deu origem a diversas outras teorizações, na verdade reelaborações, que mantêm alguns pontos em conexão, mas reconsideram outras questões. Um destes autores é Kohlberg (1971) que, como Piaget, atribui um papel fundamental à subjacente construção das estruturas cognitivas no que diz respeito à progressão moral, bem como propõe uma seqüência invariante de estágios que caracterizam esta evolução. Neste sentido, a evolução do pensamento lógico subsidia o desenvolvimento moral (a consolidação das operações formais tem se mostrado uma condição necessária à emergência dos princípios morais). Para ele, contudo, teorias puramente cognitivas são limitadas, pois não levam em conta aspectos do desenvolvimento social do indivíduo, como, por exemplo, o role taking skill, ou seja, a habilidade de considerar o ponto de vista do outro, que pode ser diferente do seu, e de coordenar estas duas perspectivas.

Kohlberg dá especial atenção ao desenvolvimento social, salientando o papel do role-taking como elemento que possibilita ao indivíduo colocar-se no lugar de outra pessoa e, assim, melhor entendê-la. Flavell, Botkin, Fay, Wright e Jarivis (1968; citados em Camino, Camino & Leyens, 1996), inclusive, diferenciam dois domínios do role-taking: role-taking perceptivo e role-taking conceitual, sendo este último visto como a capacidade de tomar a perspectiva mental do outro. Já Selman (1971, 1974, 1976; citado em Camino, Camino & Leyens, 1996), apoiando-se na distinção feita por Flavell e colaboradores aponta a estrutura e o conteúdo como dois aspectos distintos do role-taking. Enquanto a estrutura refere-se ao grau de diferenciação entre as perspectivas mentais próprias e alheias que a criança atinge e à capacidade de coordenar tais perspectivas, o conteúdo diz respeito à compreensão (conceitualização) da criança sobre os aspectos subjetivos de si e do outro, compreensão esta baseada na experiência social e determinada pelo estágio de role-taking em que a criança se encontra.

O role-taking diferencia-se, até certo ponto, da empatia, pois esta privilegia a capacidade de sentir o que o outro sente o que é diferente de compreender, cognitivamente falando, a perspectiva alheia. No entanto, poder-se-ia argumentar que há um aspecto de continuidade entre tais habilidades, podendo a empatia ser considerada como o aspecto emocional do role-taking. Existem, entretanto, controvérsias a esse respeito. Esses autores realizaram um estudo (Graham & Weiner, 1986) com crianças de 6 a 12 anos pedindo-lhes que descrevessem um episódio passado no qual tivessem sentido culpa e que avaliassem em que medida tinha sido responsáveis pelo acontecimento. Observaram que a sensibilidade ao papel da responsabilidade pessoal transforma-se notavelmente com a idade, especialmente entre os 6 e os 9 anos. Enquanto as crianças de 6 anos descreviam episódios que as faziam sentir culpa, embora reconhecendo que tivessem pouco controle sobre o acontecimento, as crianças mais velhas referiam-se a fatos que estavam mais sob o seu controle. Dessa forma, distinguem-se situações em que o dano ocorreu intencionalmente daquelas em que o acontecimento foi acidental. Como salientamos no início, grande parte dos estudos de Piaget na área de julgamento moral exigia da criança entrevistada a comparação simultânea de duas situações: uma onde um grande dano é causado acidentalmente e outra onde um pequeno dano é causado propositadamente. Levar em conta essas duas variáveis, a intenção e o dano, pode ser difícil para a criança, como demonstram os resultados de Piaget, que sugere que as crianças somente são capazes de raciocinar adequadamente sobre conteúdos relativos à moralidade aos 9 anos de idade.

O desenvolvimento moral das crianças é fortemente influenciado pelo comportamento dos pais ou dos adultos que desempenham o papel de modelo e pelo impacto das técnicas disciplinares que utilizam. Para Mussen, Conger e Kagan (1977, p. 373), "os padrões dos próprios pais e a natureza do relacionamento pais-criança desempenham um papel crucial na determinação de se o desenvolvimento da consciência numa dada criança será fraco, normal ou excessivamente rígido e punitivo". Segundo estes autores, muitos estudos têm demonstrado uma relação entre o tipo de práticas que os pais exercem e a tendência de uma criança a sentir culpa por "ter feito algo errado". Um nível de consciência elevado e reações internalizadas às transgressões se desenvolvem como resultado de relacionamentos íntimos e afetuosos estabelecidos pelos pais com a criança, bem como do uso de técnicas educativas que gerem nesta sentimentos desagradáveis decorrentes de pequenas infrações. Harris (1989) afirma que quando os pais apontam para a criança o dano subjacente à quebra de uma regra, ela aprende mais cedo a antecipar culpa após uma transgressão e espera dos outros o mesmo sentimento. Desta forma, sentir culpa diante de transgressões é um aspecto utilizado como índice do desenvolvimento da consciência e da internalização dos padrões morais.



Referências bibliográficas:

Graham, S. & Weiner, B. (1986). From an attributional theory of emotional developmental psychology: A round-trip ticket? Social Cognition, 4, 152-79.



Graham, S. (1988). Children’s developing understanding of the motivational role of affect: An atributtional analysis. Cognitive Development, 3, 71-88.



Kohlberg, L. (1971). From is to ought: How to commit the naturalistic fallacy and get away with it in the field of moral judgement. Em T. S. Mischel (Org.). Cognitive Development and Epistemology. New York: Academic Press.

domingo, 14 de março de 2010

Dança e Ed. Física: do universo escolar para o mundo social


Ao analisar a vida de qualquer civilização desde as mais remotas até os dias atuais, verificam-se como expressões culturais, atividades como: jogos, desportos e dança.
Para manifestar suas emoções e exteriorizá-las, o homem recorreu ao movimento, ao gesto, que de acordo com Fahlbusch (1990, p.15), "é a dança" em sua forma mais elementar.
O conhecimento de si mesmo e da dança, portanto, passa pela necessidade de conhecer sua própria história e as manifestações culturais de seu povo. Nesse sentido, a dança sempre visou acontecimentos importantes da própria vida, da saúde, da religião, da morte, da fertilidade, do vigor físico e sexual, também permeando os caminhos terapêuticos, artísticos e educacionais, estabelecendo assim, uma diversidade interessante para essa manifestação. Dessa forma, a dança se insere no universo cultural, expressando significados, simbolizando a existência humana.
Era por meio da expressividade que o homem primitivo demonstrava sua relação consigo próprio, com o outro e com a natureza. Essa foi sua forma de manifestação social e que serviu para auxiliá-lo a afirmar-se como membro da sua sociedade. Observa-se isso nas afirmações de Oliveira (2001, p.14), quando menciona que:
Uma das atividades físicas mais significativas para o homem antigo foi a dança. Utilizada como forma de exibir suas qualidades físicas e de expressar os seus sentimentos, era praticada por todos os povos, desde o paleolítico superior (60.000 a.C.).
Por razões historicamente determinadas a educação escolar tem privilegiado valores intelectuais em relação a valores corporais. Giffoni (1973, p.15), afirma que os problemas educacionais "(...) quase sempre são considerados pelo lado intelectual, constituindo uma das faltas da educação". Bèrge (1988, p.24) também concorda quando utiliza a metáfora "(...) O cérebro se empanturra, enquanto o corpo permanece esfomeado."
Entretanto esta visão já vem se modificando. De acordo com Ossona (1988), atualmente existe uma melhor compreensão a respeito dos valores formativos e criativos da dança, que levam a uma ampliação das ações corporais.
No Brasil e no mundo a dança vem ganhando cada vez mais espaço pelos benefícios comprovados que de acordo com Gariba (2002), vão desde a melhora da auto-estima, passando pelo combate ao estresse, depressão, até o enriquecimento das relações interpessoais. É importante, contudo, que a prática da dança com objetivos educacionais tenha início na escola, como pode se verificar em Steinhilber (2000, p.8) : "Uma criança que participa de aulas de dança (...) se adapta melhor aos colegas e encontra mais facilidade no processo de alfabetização."
Nesta perspectiva, Pereira et al (2001, p.61) coloca que:
"(...) a dança é um conteúdo fundamental a ser trabalhado na escola: com ela, pode-se levar os alunos a conhecerem a si próprios e/com os outros; a explorarem o mundo da emoção e da imaginação; a criarem; a explorarem novos sentidos, movimentos livres (...). Verifica-se assim, as infinitas possibilidades de trabalho do/para o aluno com sua corporeidade por meio dessa atividade."
Cunha (1992, p.13) também ressalta a importância do processo de escolarização da dança: "Acreditamos que somente a escola, através do emprego de um trabalho consciente de dança, terá condições de fazer emergir e formar um indivíduo com conhecimento de suas verdadeiras possibilidades corporais-expressivas."
Vargas (2003, p.13) completa que a atividade da dança na escola "(...) engloba a sensibilização e conscientização dos alunos tanto para suas posturas, atitudes, gestos e ações cotidianas como para as necessidades de expressar, comunicar, criar, compartilhar e interatuar na sociedade."
Assim, fomentar a educação através da dança escolar não se resume em buscar sua execução em "festinhas comemorativas" (VERDERI 2000, p.33); tampouco oferecer a idéia de que "dançar se aprende dançando" (MARQUES 2003, p.19). Para esta autora o estudo e a compreensão da dança corporal e intelectualmente falando, "vão muito além do ato de dançar." A importância e o significado da Educação Física implica em reflexões sobre seus paradigmas, pois se vive numa sociedade dinâmica e entende-se que essa área deve contemplar múltiplos conhecimentos produzidos e usufruídos por esta sociedade, a respeito do corpo, assim como afirma Pinheiro (2004 p.32):
"A Educação Física desenvolvida de forma consciente, respeita as diferenças (...), ou seja, as individualidades de cada um e não dicotomiza o ser humano, não separando o corpo físico do mental, entendo que ambos funcionam de modo integral".
Para Giffoni (1973, p.15) a prática da Educação Física "(...) completa e equilibra o processo educativo" e acrescenta como opção nesta área "(...) a dança em todas as suas formas de exercício" destacando que a mesma apresenta-se como uma das atividades mais completa, além de concorrer de forma acentuada para o desenvolvimento integral do ser humano.
Portanto, pensar numa escola emancipadora é pensar em um espaço não apenas de escuta, mas de permanentes representações, construções e criações, tratando de interagir a prática pedagógica da Educação Física, através da linguagem corporal "com os diferentes conhecimentos que trazem a dança" (Ramos 1998, p.2).
Para Cunha (1992, p.11), a dança merece destaque junto à Educação Física complementando as atividades de "ginástica, lúdicas, esportivas e recreativas". Também para Claro (1988, p.67) "(...) a dança e a Educação Física se completam", em que "a Educação Física necessita de estratégias de conhecimento do corpo e a dança das bases teóricas da Educação Física"
No transcorrer destas reflexões falou-se em dança e a escola, dança na escola, dança com a Educação Física enveredando-se para os caminhos da educação.
Estas discussões apontam para o compromisso que se deve ter enquanto educador, assumindo uma atitude consciente na busca de uma prática pedagógica mais coerente com a realidade, em que a dança leva o indivíduo a desenvolver sua capacidade criativa numa descoberta pessoal de suas habilidades, contribuindo de maneira decisiva para a formação de cidadãos críticos autônomos e conscientes de seus atos, visando a uma transformação social.

Espera-se que essas reflexões levem a conexões, novas idéias, discussões sobretudo do aprofundamento da dança, contemplando também a atuação enquanto professor visando cada vez mais autonomia profissional, na busca de uma formação acadêmica mais coerente com a realidade do processo educativo e social.